O teólogo Errol Hulse
define piedade: “Piedade é uma constante cultura da vida interior de santidade
diante de Deus e para Deus, que por sua vez se aplica em todas as outras
esferas da vida prática. Piedade consiste de oração junto ao trono de Deus,
estudo de sua Palavra em sua presença e a manutenção da vida de Deus em nossas
almas, que afeta toda a nossa maneira de viver”.
Um cristão sem piedade
é um desastre. Indo mais a frente, A. W. Tozer diz que: “santos sem santidade
são a tragédia do cristianismo”. A piedade e santidade que os pregadores
proclamam hoje dos púlpitos é destruída pela impiedade de suas vidas.
O declínio da piedade
hoje se deve ao fato do enorme desvio doutrinário que a igreja enfrenta hoje. A
igreja a cada dia se desvia a passos largos das Sagradas Escrituras. O profeta
Oséias exortou séculos atrás que o povo de Deus estava sendo destruído porque
lhe faltava conhecimento (Os 4.6). Piedade é algo que hoje para a maioria dos
que se professam cristãos beira a heresia, pois é tão deprimente a pregação
hoje que não promove nenhum estímulo na vida do cristão que o leve a um cultivo
de uma vida de piedade.
Para o grande teólogo e
reformador francês João Calvino pietas
(piedade) designa a atitude correta do homem para com Deus. É uma atitude que
envolve conhecimento verdadeiro, adoração sincera, fé salvadora, temor filial,
submissão e amor reverentes. Saber quem e como Deus é (teologia) envolve
atitudes corretas para com Ele e fazer o que Ele deseja (piedade). Em seu
primeiro catecismo Calvino escreveu: “A verdadeira piedade consiste em um
sentimento verdadeiro que ama a Deus como Pai e O reverencia como Senhor;
apropria-se de sua justiça e teme mais o ofendê-Lo do que enfrentar a morte”.
Nas Institutas da
Religião Cristã Calvino é mais sucinto: “Chamo de piedade aquela reverência
unida ao amor de Deus, o amor que é fruto do conhecimento de seus benefícios”. Essas assertivas estão longe de serem
vivenciadas pelos cristãos hoje, pois nada do que é pregado hoje nos púlpitos
das igrejas remetem a essas verdades, salvo raríssimas exceções (graças a
Deus), mas em quase sua totalidade o conteúdo das pregações estão distantes do
que foi asseverado pelo reformador. Assim para Calvino “toda a vida dos crentes
deve ser um tipo de prática da piedade”.
No sermão do monte Jesus exorta que a justiça dos cristãos deve exceder
a dos fariseus e mestres da Lei. De
igual podemos entender que a piedade dos cristãos deve exceder também a dos
fariseus e dos mestres da Lei. Contudo, a piedade que é vivida hoje é uma
piedade farisaica cheia de ostentação e pompa, motivada pela vaidade e
recompensada pelos homens. Mas, a verdadeira piedade ensinada e vivida por
Cristo é secreta, motivada pela humildade (artigo em extinção hoje entre os
cristãos) e recompensada por Deus.
O alvo da piedade farisaica que é vivenciada hoje não é Cristo, mas sim
as recompensas materiais que Ele pode nos conceder por vivermos de modo
piedoso. Outro fato que os cristãos ignoram é que os verdadeiros cristãos que
querem viver de modo piedoso sofrem perseguições (II Tm 3.12). O conceito de
piedade hoje passa por uma série de recompensas concedidas por Deus a todos os
que vivem “piedosamente” e a privação de sofrerem quaisquer infortúnios. Para
muitos, hoje, sofrer é um sinal de uma vida em pecado, longe da presença de
Deus e não de piedade. Será que esses que defendem tal argumento não leem na
Bíblia acerca da vida do apóstolo Paulo e sobre os seus sofrimentos? Será que
tais sofrimentos eram consequência de uma vida de pecados ou de uma piedade
rigorosa que honrava a Deus e que humilhava o homem? O alvo da piedade e da
vida cristã a muito tempo deixou de ser Cristo e passou a ser as recompensas
que podemos alcançar em Nome Dele e por conta disso surge toda sorte de
bizarrices e doutrinas contrárias ao evangelho da graça de Cristo.
O pastor e teólogo reformado holandês Joel Beeke diz: “o alvo da
piedade, bem como de toda a vida cristã, é a glória de Deus – a glória que
resplandece nos atributos de Deus, na estrutura do mundo, na morte e na
ressurreição de Jesus Cristo. No que diz respeitos a todos os que são
verdadeiramente piedosos, o glorificar a Deus supera a salvação pessoal”. A
piedade cristã autêntica é referendada pelo SOLI DEO GLORIA, pois toda a nossa
vida deve ser vivida pra a glória de Deus (I Co 10.31). De acordo com Calvino o
homem piedoso confessa: “Somos de Deus; vivamos e morramos para Ele. Somos de
Deus; sejamos governados por sua sabedoria e vontade em todos os nossos atos.
Somos de Deus; em harmonia com isso, devemos segui-Lo como nosso único objetivo
lícito, em todos os aspectos de nossas vidas”. Ao analisarmos nossas vidas
sobre a óptica dessa assertiva de Calvino observamos que vivemos em uma
deturpação incrível e bem distante dos ideais bíblicos que deveriam nortear
nossas vidas.
Joel Beeke prossegue: “Deus redime, adota, santifica o seu povo, para
que sua glória resplandeça nele e o liberte da busca pelo egoísmo ímpio. O
profundo interesse do homem piedoso é Deus mesmo e suas coisas – sua Palavra, sua
autoridade, seu evangelho, sua verdade. O homem piedoso tem intenso desejo de
conhecer ais a Deus e de ter mais comunhão com Ele como seu único alvo”. Todavia
nos perguntamos como poderemos glorificar a Deus, para obtermos tal reposta nos
voltamos para Calvino: “Deus nos prescreveu uma maneira pela qual Ele pode ser
glorificado por nós, a saber, a piedade, que consiste na obediência à sua
Palavra. Aquele que ultrapassa esses limites não está honrando a Deus; pelo
contrário, está desonrando-O”.
Encerro este artigo citando novamente Joel Beeke e na sequência João
Calvino. Joel Beeke diz: “A obediência à Palavra de Deus significa refugiar-se
em Cristo para perdão dos nossos pecados, conhecê-Lo por meio de sua Palavra,
servi-Lo com um coração repleto de amor, praticar boas obras em gratidão a sua
bondade e exercitar a autorrenúncia, a ponto de amar os nossos inimigos. Esta
resposta envolve total rendição a Deus mesmo, à sua Palavra e à sua vontade”. Já
o teólogo e reformador francês João Calvino disse: “Ofereço-te o meu coração
Senhor, sincera e imediatamente”. Esse é o desejo de todos os que são
verdadeiramente piedosos. Porém esse desejo só é possível de ser realizado
apenas por meio da comunhão com Cristo e participação Nele; pois, longe da
pessoa de Cristo, o homem religioso vive apenas para si mesmo, ou como dissemos
antes, vive uma vida piedosa de ostentação que é motivada pela vaidade e
recompensas humanas. E apenas em Cristo os piedosos podem viver como servos
voluntários, soldados leais e valorosos de seu Comandante; filhos obedientes do
seu Eterno e Soberano Pai.
Que Deus tenha misericórdia e nos ajude!!!
Soli Deo Gloria!!!
Joel da Silva Pereira